Como gerir uma mudança familiar

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Helena Martins

Não é fácil proceder a uma mudança familiar. Quando as mudanças dependem só de nós, fica unicamente na nossa esfera de intervenção alterar alguma coisa que não gostemos. Podemos mesmo decidir alterar as nossas circunstâncias e modos de vida.

O problema coloca-se quando as mudanças que necessitamos fazer afetam a vida de outras pessoas. Nesses casos, a tomada de decisão não nos compete unicamente a nós. São necessárias outras opiniões, perspetivas e modos de sentir.  Por vezes, torna-se necessário negociar soluções para satisfazer os interesses de todos os intervenientes.

O que afeta a vida de um afeta toda a família

O Henrique atravessava uma crise e demorou algum tempo até conseguir identificar as causas reais do seu sentimento de vazio e insatisfação. Aparentemente, tinha tudo para ser feliz. Na meia-idade, usufruía de uma situação financeira desafogada que lhe permitia fazer algumas extravagâncias. Os dois filhos estavam criados, ambos independentes e mantinha com a esposa um relacionamento estável de mais de vinte anos. Porquê, então, essa sensação de vazio e insatisfação?

As respostas começaram a surgir após um período de reflexão, facilitado por vários exercícios inseridos num trabalho de desenvolvimento pessoal.

A verdade é que o Henrique era um homem de gostos simples. Adorava estar em contacto com a terra e vibrava com o ciclo natural das estações do ano. Sentia-se rejuvenescido e pleno de vigor quando em comunhão com a natureza. Era oriundo de um meio rural e por força das circunstâncias, para conseguir prosseguir estudos e desenvolver a sua carreira profissional optara por morar em Lisboa. Aí acabara por casar e constituir família. Porém, na fase específica em que se encontrava, sentia um impulso para regressar ao meio rural e dar início a uma nova etapa da sua vida.

Quando foi utilizada uma técnica específica para visualização de um futuro ideal, os seus olhos encheram-se de lágrimas. Via-se a viver numa casa perto de pomares e olivais. Nessa visualização ele era produtor, tratava da terra e efetuava contatos com mercados agrícolas. No final da visualização, a sua sensação de felicidade foi tão intensa que o seu desejo era não regressar nunca mais à realidade.

Família num pomar, colocando fruta num caixote.

Do sonho à realidade

Assim que regressou à realidade, o Henrique esmoreceu. De repente ocorreu-lhe que a família não iria aprovar uma mudança para o campo.

A verdade nua e crua é que a companheira não gostava de viver no campo. De gostos citadinos, a Cristina era apreciadora da agitação, das compras, do glamour das modas, dos espetáculos e exposições artísticas. Acompanhá-lo para um meio rural, seria idêntico a retirar um peixe da água.

Como eu observara antes, nem sempre é fácil proceder a mudanças quando existem outras pessoas implicadas no processo. Se formos os únicos intervenientes no processo, podemos com menor ou maior esforço levar a cabo uma mudança capaz de nos conduzir a uma vida com significado. Já uma mudança familiar não é tão linear. Essa mudança implica a vida de outras pessoas. Carece por isso de outras opiniões, perspetivas e modos de sentir. A nossa vontade pode mesmo entrar em conflito com a vontade dos outros.

O Henrique não tinha o direito de arrastar a companheira para uma vida no campo. Mas, bem vistas as coisas, a companheira também não tinha o direito de prender o Henrique na cidade agora que este tomara consciência que já não era feliz ali.

O que fazer perante um dilema destes?

Antes de mais, é preciso que entendamos que o que vivemos no presente é o resultado dos nossos pensamentos e ações tomadas no passado. Encontramo-nos no cenário em que, num determinado ponto, decidimos estar. Provavelmente esse cenário foi-nos útil até então. Capacitou-nos com aprendizagens e experiências que foram importantes para nós e nos conduziram ao momento presente.

Seguidamente, precisamos saber com clareza o que queremos no futuro. Para onde queremos ir? Que experiências queremos viver? Só dessa forma é possível começarmos a delinear um novo caminho e esboçar um plano de ações. É necessário aceitar que a mudança é inevitável e vai envolver riscos. Vai ser preciso sair da zona de conforto e ter disposição para agir.

Chegar a um consenso

Nos primeiros momentos, o Henrique teve a perceção que uma separação seria a única saída possível. Ou então tinha de sacrificar os seus sonhos.

Chegados a este ponto, é preciso dizer com toda a honestidade que quando os propósitos de vida de um casal são divergentes, torna-se inevitável uma rotura. Mas, neste caso em concreto, a união era perfeitamente funcional. Existiam laços de respeito, partilha e cumplicidade. Acima de tudo, existia amor.

Assim, centrados no amor, conseguiu-se chegar a um consenso. Depois de um diálogo sincero em que o Henrique expôs frontalmente as suas insatisfações e os seus sonhos, existiu um momento de confusão quanto ao futuro. Houve um período de resistência e incompreensão. Após alguns avanços e recuos, foram surgindo ideias por parte de todos os elementos da família. Negociaram-se cedências de parte a parte. E por fim conseguiu-se chegar a uma solução aceitável para todos.

A decisão final passava por se mudarem para uma cidade mais pequena, a curta distância de um terreno de árvores de frutos que correspondesse ao idealizado pelo Henrique. A Cristina acedeu a mudar-se da capital, não prescindindo do meio urbano em que se sentia confortável. O Henrique cedeu a não habitar no espaço rural, mas ganhando proximidade ao terreno que desejava.

Os filhos aceitaram a resolução dos progenitores. O mais novo percebeu até mais tarde que compartilhava da mesma paixão do pai. Afinal, a mudança que o Henrique começou por percecionar como fonte de conflitos acabou por conduzir ao fortalecimento dos laços familiares.

Quatro pessoas sentadas a uma mesa, tomando chá e consultando documento. Transmitem sensação de paz, harmonia e união. Mudança familiar estará na origem.

Clarificação, comunicação e negociação

Do que necessitamos afinal para gerir uma mudança familiar ou que implique mais do que uma pessoa?

  • Tomar consciência e clarificar muito bem aquilo que se necessita para uma vida plena.
  • Promover uma comunicação que seja eficaz. Dar a saber a nossa verdade, cruzando-a com a verdade dos outros. Expor argumentos e formas de sentir. Ter medo do conflito ou fechar-se em si mesmo e não comunicar a sua verdade, não é o caminho correto.
  • Dispor-se a negociar soluções que vão ao encontro das necessidades de todos os intervenientes.

Mudança familiar – uma reflexão

Podes querer considerar as seguintes questões para reflexão:

  • De 0 a 10 como classificas o nível de satisfação com a tua vida neste momento?
  • O que sentes que precisa de ser mudado? Porquê?
  • O que te impede de mudar, de avançar?
  • Essa mudança está unicamente nas tuas mãos ou implica outras pessoas?
  • Que soluções te permitiriam proceder às mudanças que desejas, com o mínimo de perdas?
  • Com quem precisas de dialogar e negociar?

O respeito por nós próprios e pelos outros é fundamental para gerir uma mudança familiar. Por vezes, são necessárias roturas temporárias ou definitivas para que todos possam ficar bem. Afinal de contas, sacrificar os próprios sonhos para atender às preferências dos outros não é solução.

O amor verdadeiro implica a plena liberdade de nós próprios e dos outros. Temos o direito e o dever de ser tão felizes quanto possamos ser. Só dessa maneira poderemos fazer felizes quem nos rodeia.

*Helena Martins é Terapeuta e Coach com foco em Propósito de Vida e Transformação Pessoal. Nas suas consultas utiliza ferramentas do Life-Coaching, da Terapia Transpessoal, do Método de Louise Hay e da Psicossomática.

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