A amizade é um dos vínculos interpessoais mais significativos nos seres humanos. Apesar disso, não existe um consenso acerca do que significa de facto a amizade. Digamos que esse significado pode diferir da época, da cultura ou até da interpretação que cada um de nós faz a esse respeito. Podemos até considerar que existem vários tipos de amizade.
O que são amizades verdadeiras
Na antiguidade, os gregos falavam muito acerca deste tipo de amizade. Atribuíam-lhe o termo “philia”. Seria um vínculo espiritual, entre pessoas consideradas iguais, um “amor entre amigos”.
Dessa forma, a amizade verdadeira assenta nos alicerces da sinceridade, lealdade, confiança, boa vontade, cumplicidade e respeito mútuo. Pode mesmo implicar algum tipo de sacrifício ou renúncia. Desse modo podemos dizer que neste tipo de amizade existe afeto, empatia, entendimento, identificação com o outro e partilha de sentimentos.
De amizades verdadeiras costumamos obter apoio, consolo e compreensão. Com amigos desse tipo podemos confidenciar as nossas preocupações, angústias e segredos. Podemos contar com as suas palavras, que nos incentivam e inspiram. Em suma, podemos dizer o que pensamos e ser quem somos. Somos aceites sem reservas, com as nossas qualidades e defeitos.
Amizades verdadeiras são aquelas onde podemos contar com alguém ao nosso lado nos bons e maus momentos. Mesmo estando distante, essa pessoa faz-se presente nos momentos mais cruciais. A ele abrimos o coração, contando-lhe o que nos vai na alma. Até no silêncio sentimos a sua presença. Sentimos que essa pessoa é alguém muito importante na nossa vida, comparável com um irmão.
Nas amizades verdadeiras também existem discussões e divergências
Não se pense que se trata de um relacionamento idílico pois isso não é verdade. Nas amizades verdadeiras existem também discussões e aborrecimentos. Não necessariamente se gosta das mesmas coisas nem se é idêntico ao outro. Na realidade, muitas vezes as opiniões não convergem e está tudo bem com isso. No final de contas, acaba sempre por existir espaço para o diálogo e entendimento.
Um amigo verdadeiro vê no outro algo que já existe em si próprio ou que deseja alcançar no futuro. De igual forma, deseja para o outro aquilo que deseja para si próprio. Por isso, este tipo de relacionamento favorece o crescimento mútuo entre os intervenientes.
As amizades verdadeiras não são escolhidas pela mente e sim pelo coração. Por isso, intuitivamente todos nós sabemos muito bem aqueles com quem podemos de facto contar.
“O que é um amigo? Uma única alma habitando dois corpos.”
Aristóteles
Questões para reflexão:
- Consideras ter amizades verdadeiras?
- Quem foram os teus melhores amigos até hoje?
- Qual a razão para os considerares como melhores amigos? Quando precisavas de ajuda ou suporte emocional recorrias a eles? Estavam disponíveis para ti? Eles tinham os mesmos valores do que tu?
- Quais os amigos que ficaram para trás? Porquê?
- Estás a desenvolver esforços para preservar velhas amizades? E para fomentar novas amizades?
- Caso não tenhas amigos, o que ganhas por não os ter? E o que estás a perder por não os ter?
Amizade por interesse
Muito diferentes das amizades verdadeiras, as amizades por interesse são centradas na satisfação de interesses pessoais. Muitas pessoas consideram como amigas quem as acompanha nas idas ao ginásio, às compras, ao café, aos bares, discotecas, festas ou outro tipo de diversões.
Não quer dizer que seja mau considerar como amigos pessoas que servem um propósito específico na nossa vida. Como seres sociais que somos, precisamos de pessoas com quem conversar e conviver. Inclusivamente, uma amizade dita verdadeira pode começar desta forma. Contudo, devemos ser capazes de fazer a distinção entre um tipo de amizade e outro.
No seu lado mais negativo, temos aquela pessoa que no trabalho ou no meio académico escolhe as amizades entre aqueles que, de alguma forma, poderão fazê-lo subir de posição ou obter algum tipo de favor. Essas pessoas têm por costume entrar em competição com colegas diretos e bajular os que estão em posição hierarquicamente superior.
Este tipo de “amizade”, baseada na conveniência, é muito comum na esfera social. Basicamente trata-se de procurar travar amizades com aqueles que poderão trazer algum tipo de vantagem. Tanto pode ser para partilhar conhecimento, informações ou outro tipo de vantagens como posição social, poder e popularidade. Assim que a pessoa alvo deixa de ter utilidade, é descartada para dar lugar a outra em melhor posição. Dessa forma, convém estar alerta para este tipo de manipulação e saber separar o trigo do joio. Caso contrário, seremos enganados por quem pretende somente utilizar-nos como um trampolim para alcançar os seus objetivos.
Amizade virtual
Como todos sabemos, nos dias de hoje é possível criar ou manter uma amizade estando em países ou até em continentes diferentes. A presença física não é, nem nunca foi aliás, condição indispensável para a criação de vínculos de amizade. Antigamente faziam-se amizades por correspondência.
Atualmente, pode ser estabelecido ao minuto, através da internet, aquilo que há décadas atrás demorava tempos infinitos. Afinal, na sociedade moderna, dispomos de toda uma tecnologia que pode ser facilitadora de conexão e partilha. E isso, nesse aspeto, é benéfico.
Não obstante, não podemos deixar de apontar os aspetos negativos das interações meramente virtuais. Como, por exemplo, a dificuldade em percepcionar corretamente o emissor e a sua mensagem. Como resultado podem surgir más interpretações, distorções e enganos que obviamente prejudicam a comunicação.
Por outro lado, existe uma maior predisposição para se procurar mostrar apenas a parte positiva da personalidade. Assim, corremos sempre o perigo de criar uma amizade que não assenta na realidade mas antes representa um imaginário idealizado. Quantas pessoas não iniciaram uma amizade ou mesmo um romance desta forma para descobrir mais tarde, quando em modo presencial, que a personalidade dessa pessoa não correspondia de todo ao que tinham suposto?
Brincando um pouco, será também conveniente não cair na ilusão de acreditar ter toda uma legião de amigos, conforme os “Likes” recebidos nas redes sociais. Seguidores nas redes sociais não são necessariamente nossos amigos. Amigos verdadeiros procuram a tua companhia ao vivo ou utilizam outros canais de comunicação mais diretos.
Amizades falsas ou tóxicas
No campo oposto às amizades verdadeiras, aparecem as amizades tóxicas. Devido a circunstâncias que não vão ser exploradas neste artigo, não é raro que vínculos mais ou menos prolongados sejam estabelecidos com as pessoas erradas. Esses falsos amigos, além de não proporcionarem nenhum tipo de apoio emocional, ainda podem acabar por limitar de alguma forma o crescimento pessoal.
Seguem-se alguns exemplos do que pode definir uma amizade tóxica:
- Ausência de honestidade e lealdade no relacionamento;
- Sentir que as suas diferenças não são compreendidas nem aceites;
- Sentir necessidade de esconder certas facetas da personalidade;
- Sentir a imposição de fingir ser quem não se é;
- Apresentar demasiadas justificações quanto à sua conduta;
- Sentir pressão para se comportar de uma determinada forma;
- Existir algum tipo de bajulação na relação, mesmo que de uma forma subtil;
- Ser procurado nos momentos de necessidade e ignorado nos momentos em que não se faz falta;
- Sentir uma espécie de frieza em relação às suas vitórias ou fracassos. Ou então sentir que existe fingimento no que seria suposto ser uma expressão de apoio;
- Ser-se procurado por aquilo que se tem e não por aquilo que se é.
Infelizmente, numa amizade dita tóxica pode existir violência psicológica, verbal ou mesmo física. Não é raro ser-se alvo de humilhações e chacotas em público, bem assim como ser-se sujeito a abusos de qualquer espécie.
Porque alguém se sujeitaria a uma situação destas? Uma baixa autoestima, provocada por um passado traumático, pode fazer com que alguém se mantenha num relacionamento deste tipo. Por isso a importância de se ter uma Autoestima saudável.
É amizade ou amor?
O amor pode exprimir-se de várias formas. Mário Quintana disse um dia que a amizade é um amor que nunca morre. E as amizades verdadeiras, revestindo-se de um bem-querer desinteressado, são de facto uma forma de amor. Pois que outro sentimento nos levaria a alegrar-nos com as alegrias do outro, a entristecer-nos com as suas tristezas, a querer o melhor para a sua vida e a desejar oferecer-lhe conforto emocional quando necessita?
Neste ponto, convém destrinçar entre relacionamentos de amizade e relacionamentos amorosos. Em ambos existem muitas coisas em comum. Tanto num caso como noutro existe uma forte conexão emocional, a troca de ideias, a partilha de segredos, o respeito, a admiração recíproca, a afinidade e o afeto.
A amizade pode transformar-se em amor romântico. Da mesma forma, o amor romântico pode transformar-se numa simples amizade.
Verificamos que a linha que separa a amizade do amor é muito tênue. Para discernir entre os dois, talvez seja mais fácil estabelecer quais são as suas diferenças essenciais.
Relacionamento amoroso vs. amizade
E aqui podemos apontar que num relacionamento amoroso existe o desejo de intimidade física. Atenção que intimidade não significa necessariamente compulsão sexual, é algo bem mais complexo. Pode existir sexo sem intimidade e intimidade sem sexo. Não obstante, é óbvio que o desejo sexual e a intimidade física são fortes indicadores que separam a amizade do amor. Em paralelo existe a vontade de exclusividade e do estabelecimento de um projeto de vida a dois.
Na amizade não existe desejo sexual. O coração não acelera quando estamos na companhia da outra pessoa. Não existem suores frios nem borboletas no estômago. Não existe vontade de exclusividades. Seguimos projetos de vida que tanto podem ser idênticos como diferentes.
Ainda confuso quanto a se o que sentes é amor romântico ou amizade? Os antigos apelavam sempre a escutar o próprio coração. As batidas cardíacas, a par com o silêncio de uma profunda reflexão, são sempre os nossos melhores conselheiros.
Conclusão
Nas amizades verdadeiras existe um vínculo afetivo onde predomina a sinceridade, lealdade, confiança, cumplicidade e respeito mútuos. Com um amigo podemos expressar-nos livremente, sermos nós próprios e até mesmo dar asas a uma “loucura” saudável. Temos permissão para brincar.
Amizade por interesse é talvez a forma mais usual de amizade nos dias de hoje. Convém ter cuidado para não acabar por ser usado por quem pretende somente tirar vantagens. Além disso, precisamos identificar e afastar-nos de amizades ditas tóxicas. Além de nada acrescentarem às nossas vidas, podem mesmo impedir o nosso crescimento pessoal e causar-nos sérios prejuízos emocionais e psicológicos.
Amizade virtual é muito comum e pode oferecer mais benefícios do que malefícios, principalmente se a distância for um obstáculo a vencer. Por outro lado, muitas vezes, a verdadeira amizade pode ser confundida com amor romântico. Ou então, o que começou por ser uma amizade pode transformar-se com o tempo em amor romântico.
*Helena Martins é Terapeuta e Coach com foco em Propósito de Vida e Transformação Pessoal. Nas suas consultas utiliza ferramentas do Life-Coaching, da Terapia Transpessoal, do Método de Louise Hay e da Psicossomática.